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A geopolítica do “Grande Caribe”: ameaça à Amazônia e à integração da América do Sul


O Brasil terá que mudar, com urgência, a sua política para a Amazônia, se quiser manter a sua soberanía sobre a região, a médio prazo. A silenciosa ocupação internacional da região, por intermédio da imposição de imensas reservas indígenas e florestais, como parte de uma política essencialmente controlada pelo aparato ambientalista-indigenista internacional, especialmente, nas áreas de frontera com a Colômbia, Venezuela e Guianas, pode passar rápidamente a ações de ocupação efetiva, com o propósito de controlar os recursos naturais da região – diretamente ou impedindo a sua exploração soberana pelos brasileiros.
Um motivo de preocupação deve ser o declínio estratégico anglo-americano, na Ásia e no Oriente Médio. Independentemente do desfecho da investida contra o regime de Bashar al-Assad na Síria, as virulentas pressões diplomáticas e a maldisfarçada participação de forças especiais e recursos militares anglo-americanos no conflito demonstra, em grande medida, uma perda de controle na região e uma insanidade crescente dos círculos mais belicistas do Establishment.
Uma consequência desse declínio estratégico é uma reorientação do poder anglo-americano para o Hemisfério Ocidental, como temos assinalado em artigos recentes nesta Resenha. Evidências desta tendência são as articulações diplomáticas de Washington na América do Sul, visíveis na crise presidencial no Paraguai e no patrocínio à criação da Aliança do Pacífico, o novo bloco continental pactuado entre o Chile, Peru, Colômbia e México.
Essa guinada estratégica foi o tema central de um recente artigo dos jornalistas Robert D. Kaplan e Karen Hooper, publicado em 18 de julho no sítio da agência de inteligência privada Stratfor, intitulado “A fonte do poder estadunidense”. Afirmam os autores:
Historicamente, o poderio geopolítico estadunidense tem a sua origem, não na Europa ou na Ásia, mas no Grande Caribe. O Grande Caribe é o mundo que vai de Yorktown às Guianas, ou seja, dos estados mesoatlânticos às selvas do norte da América do Sul. O Hemisfério Ocidental, como o estrategista holandês-americano Nicholas J. Spykman explicou, em 1942, não se divide entre a América do Norte e a do Sul. Ele se divide entre as latitudes ao norte da grande barreira da selva Amazônia e as latitudes ao sul dela. Em outras palavras, sob uma ótica geopolítica, a Venezuela não é, absolutamente, um país sul-americano, mas caribenho. A maior parte da sua população de 28,8 milhões vive no norte, ao longo do Mar do Caribe, longe das selvas do sul.
Embora os cabeçalhos midiáticos de hoje falem do Oriente Médio e da Ásia, para muitos presidentes dos EUA, do início do século XIX ao início do XX, as crises de política externa se centraram no Grande Caribe. Foi um processo de 100 anos para que os jovens EUA, realmente, tomassem das potências europeias o controle do Grande Caribe. O Grande Caribe – o Golfo do México e o Caribe, propriamente dito – é, de fato, uma extensão territorial de águas azuis do território continental dos EUA. A influência sobre ele se deve à construção do Canal do Panamá, no início do século XX. Uma vez que os EUA puderam assegurar o controle do Grande Caribe, o país se tornou o hegemon do Hemisfério Ocidental, restando apenas o Ártico Canadense e o cone sul da América do Sul (inclusive as zonas de sombra da Bolívia, Equador e Peru), efetivamente, além do cinturão de segurança estabelecido pela Marinha dos EUA nas Índias Ocidentais. E com o Hemisfério Ocidental sob a sua dominação, os EUA puderam, a partir daí, afetar o equilíbrio de poder no Hemisfério Oriental. As vitórias estadunidenses nas duas guerras mundiais e na Guerra Fria foram, originalmente, construídas sobre a geopolítica do Grande Caribe.
Porém, como as distâncias entraram em colapso, em um mundo mais densamente povoado e crescentemente unido pela tecnologia, o Grande Caribe volta novamente ao palco. (…)
A menção a uma área “de Yorktown às Guianas”, ou seja, da Virgínia à fronteira com o Brasil, provém de um velho conceito dos Confederados estadunidenses mais radicais, como os Cavaleiros do Círculo Dourado, uma sociedade semi-secreta que, antes da Guerra Civil Americana (1861-1865) contemplava a criação de uma área escravagista oligárquica em toda aquela região. Não por acaso, o próprio Kaplan, como muitos dos mais proeminentes pensadores “neoconservadores” dos EUA, são admiradores abertos das ideias da Confederação, derrotadas por Abraham Lincoln, na Guerra Civil.
A isso, é preciso agregar a ideia oligárquica de “congelar” o desenvolvimento do que chamam a “Ilha da Guiana”, área delineada pelo rio Orinoco, o canal de Cassiquiare e o rio Negro, o que inclui toda a Calha Norte do Amazonas. O centro da “ilha” é, precisamente, o estado brasileiro de Roraima, que tem sido submetido a uma draconiana “esterilização territorial”, com a maior parte de seu território demarcado como áreas indígenas ou reservas naturais, que obstaculizam quaisquer atividades econômicas modernas. No caso, a miopia estratégica levou sucessivos governos brasileiros a permitir no estado a formação das gigantescas reservas ianomâmi e Raposa Serra do Sol, ambas fronteiriças.
A relevância de tais considerações se torna evidente, diante das considerações de Kaplan e Hooper, que antecipa uma oportunidade ideal para a implementação da estratégia mencionada, na morte do presidente venezuelano Hugo Chávez, que dá como certa, antes ou durante as vindouras eleições presidenciais no país, em outubro próximo. Ademais, ele ameaça a Colômbia com um processo de desestabilização, prevendo um retrocesso na guerra do Estado colombiano contra as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC). Fatos que, em sua avaliação, teriam um grande potencial de desestabilização de toda a região norte da Amazônia, diante dos quais adverte que os EUA poderiam até intervir militarmente, mas não evitariam o caos. Suas palavras:
Assim, Washington não poderia contar com uma estabilização, nem na Colômbia nem na Venezuela, sem falar na guerra das drogas no México, com 50 mil mortes desde 2006 – com a maior parte da violência ocorrendo no norte do México, próximo à fronteira com os EUA. Os EUA podem dominar o Grande Caribe, em termos do seu poderio militar convencional. Podem dominar o Grande Caribe, no sentido de que nenhuma potência relevante pode desafiar os EUA ali. Mas tal poderio estadunidense não pode garantir a estabilidade em lugar algum dentro da própria região.
Evidentemente, poder-se-ia considerar que o texto de Kaplan e Hooper é produto de um surto psicótico comum em estrategas desequlibrados sob condições de estresse agudo, em tempos de crise, exceto pelo fato de ele ser membro do Conselho de Política de Defesa (nomeado pelo então secretário de Defesa Robert Gates, em 2009), consultor do Exército, Fuzileiros Navais e Força Aérea dos EUA e ex-professor visitante da Academia Naval de Annapolis, onde ministrou um curso sobre “Futuros desafios de segurança global”. Semelhante currículo leva alguns analistas, como o jornalista mexicano Alfredo Jalife-Rahme, a considerá-lo como “um arauto do Pentágono para sentir o pulso de seus adversários e/ou ameaçá-los”. A revista Foreign Policy, onde escreve regularmente, o considera entre os 100 maiores pensadores estratégicos globais. Embora com um currículo mais modesto, sua colega Hooper é diretora de análises para a América Latina e África da Stratfor.
Está claro que o aprofundamento da crise econômico-financeira mundial, o declínio militar dos EUA e a emergência de um pensamento estratégico temerário em certos círculos hegemônicos, constituem uma séria ameaça real à soberania dos Estados nacionais ibero-americanos. Isto implica em que a delimitação de gigantescas áreas na Amazônia brasileira como autênticas “zonas de exclusão econômica”, por motivos ambientais ou indígenas – seja por ingenuidade ou irresponsabilidade – passa ao largo da possibilidade real de que estas possam transformar-se em alvos de operações militares.
Para o Brasil, evidentemente, tal perspectiva torna urgente a necessidade de uma drástica reversão da política de demarcação de reservas indígenas desproporcionais, juntamente com a promoção de uma ocupação socioeconômica racional da Região Amazônica, com um engajamento efetivo das próprias populações indígenas, segundo as suas peculiaridades culturais, no desenvolvimento e na defesa da soberania brasileira. Antes tarde do que nunca.

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